Parte 03 - Ezekiel e a Tenda de Estrelas

PARTE TRÊS

 “Aonde as primeiras pistas sobre Ezekiel aparecem, lendas exigem saber sobre suas origens, Zara compreende sua jornada, fadas montam exércitos, a fada Ÿorn dá umas belas resmungadas e o Saci fica puto da vida”



Em uma pequena casa em São Paulo uma moça está sentada numa cadeira de escritório com a porta da casa aberta  e olhos arregalados e pregados na entrada.

O tapete da entrada aonde está escrito “Bem Vindo” que de onde ela está se lê “odniV meB” se embaralha e embaça quase que por completo através de seus olhos mareados da angústia da espera.


Ela pensa;
- Já fazem quantos dias mesmo? Quarenta e cinco? Quarenta e oito? Nenhuma ligação, nem ao menos um trote, nada, nem o Humberto, nem ninguém de nada, Odniv Meb é tudo que eu vejo, é só o que me passa pela cabeça agora...
Odniv Meb...

Então ela ouve de longe uma voz chamar seu nome e quando olha do outro lado da rua vê um homem com cabeça de gavião e asas enormes acenando para ela.  

- Ana Lúcia!

E o que antes parecia ser um gavião com corpo humano era na verdade Silas atravessando a rua gritando seu nome.

- Tá louca de vez mesmo é mana? Porta aberta assim hoje em dia nessa cidade? A quantos dias você não dorme?

 E Silas vai entrando e fechando a porta da casa da irmã, notando a bagunça das roupas e louças pela sala.

- E também a quantos dias você não toma um banho e não move uma xícara ou uma colher de lugar?

E Ana Lúcia finalmente se levanta esticando os braços e endireitando as costas, desabafando sua angústia com o irmão;

- Estava me perguntando agora mesmo quantos dias fazem que ele não volta, por que não recebemos nenhuma ligação, aonde foi parar o Humberto que não atende mais o celular, o telefone do escritório dele dá ocupado, ele só pode estar me evitando, tenho medo, vergonha, sei lá o que de ligar para a sala do delegado ou ir até lá, só quero ficar aqui sentada lendo esse ta...

Ana Lúcia para por um segundo e diz;

- Nossa! Silas! Agora que lembrei! Que porcaria você tava fazendo com uma fantasia de galinha do outro lado da calçada?

Silas espantado com a pergunta senil da irmã responde alterado;

- Fantasia de gali ... Ana Lúcia! Chega disso! Você vai tomar um banho bem comprido agora! Daqui a pouco agente conversa! Entra naquele chuveiro já! Enquanto isso vou ligando pra mamãe e pro papai que estão chegando a qualquer momento!

E Ana Lúcia dá um salto assustado enquanto caminha para o banheiro segurando-se nos móveis.
 Ela pergunta aflita;

- O papai e a mamãe estão chegando??? Como assim? E minha casa tá parecendo um filme de terror? Como você me fala uma coisa dessas só agora Silas?!

E Silas responde;

- Eles estão preocupadíssimos com você e já saíram de Andradas a mais de quatro horas, devem estar para chegar, fiquei sabendo só hoje de manhã também quando a mamãe ligou cedinho, logo antes do meu gato derrubar toda minha estante de livros. Minha manhã começou bem estranha mana e eu já te disse que só conversamos depois de você tomar esse banho! Vou adiantando a arrumação da casa enquanto isso e logo mais telefono pra mamãe pra saber aonde eles estão!

Mas Ana Lúcia insiste apoiada na maçaneta da porta do banheiro;

- Manhã estranha porque? É alguma coisa sobre o Ezekiel? O que foi de estranho na sua manhã?

E Silas dá um só grito;

-BANHO!

E ela entra no banheiro sem falar mais nada.

Silas tenta colocar um cd no rádio para ouvir um som enquanto arruma a casa mas o rádio devolve todos os cd’s que ele tenta colocar, então ele acaba sintonizando numa estação qualquer e fica surpreso ao ouvir que está tocando a música de um cantor que ele gosta muito e que mesmo já tendo gravado dois ou três discos e morrido a bons anos atrás ele absolutamente nunca havia ouvido uma só canção deste cantor na rádio, ao terminar a música o locutor diz; 

- Essa foi para aqueles que conheceram a boa música psicodélica do sertão que estourou no final dos anos setenta e no início dos anos oitenta no Brasil, essa música foi de quando os artistas andavam de perna de pau pelas ruas convidando as pessoas para um grande espetáculo, essa foi uma das que muito pouco tocou nas rádios e que só tocou hoje porque Silas Brandão Lopes Neto está conosco diretamente da sala da casa da irmã dele! Não é isso mesmo Silas? Boa tarde pra você meu querido!

Um silêncio mortal se estabelece na sala e Silas fica paralisado em choque sem saber como desviar seus olhos do rádio, sem conseguir gritar para sua irmã ou soltar um palavrão assustado qualquer, na esperança de que algum outro Silas Brandão Lopes Neto estivesse  na sala da irmã do outro lado do telefone falando com o locutor da rádio.

Mas o silêncio continua até o locutor voltar a chama-lo agora com um pouco mais de pressa e euforia;

- Silas! Agora é sério! Não temos muito tempo! Sente-se rapidinho no sofá.

Silas então lentamente encosta a vassoura e senta no sofá, a voz do locutor lhe causa tontura e ecoa em sua cabeça como se fossem vozes por de dentro fazendo com que ele não consiga ao menos pensar em uma pergunta absurda qualquer, e é somente neste momento que ele nota o ventilador ao lado da estante girando lentamente seguido de um estranho borrão no ar, como se fosse uma imagem em câmera lenta;

Ele na verdade estava dentro de um canal paralelo do espaço/tempo, aberto através de uma comunicação feita por uma pessoa de um plano fora da orbe terrestre, esta pessoa utilizou das ondas do rádio para ajustar sutilmente sua frequência às ondas emitidas pelo cérebro de Silas, assim ele pôde simular imaginações ao seu cérebro criando para ele uma realidade aonde o locutor da rádio falasse com ele.

Devido a infiltração da informação ser através das ondas de manifestação espontânea do consciente coletivo, tudo o que é dito pelo locutor é automaticamente gravado no cérebro de Silas como se ele mesmo tivesse pensado aquilo. 
Por isso as palavras ecoam dentro dele desnorteando seus pensamentos fazendo com que ele respire angustiadamente tentando balbuciar alguma coisa para o locutor da rádio que devido a sua pressa acaba por se manifestar novamente;

- Silas! Os desenhos dentro do livro do Saci! Vai até a pereira e apenas diga em voz alta que fui eu que te mandei até lá!

Silas mais do que confuso responde;

- Livro do Saci? P-pereira? Aonde? E-eu quem? Quem é você? Que diabos é isso?

E o locutor responde;

- Sou eu Silas! Ezekiel oras! Quem mais te falaria sobre o livrinho do Saci? Finalmente você se conectou pra valer com a história e eu pude abrir este canal para conversarmos. Você vai achar a pereira cunhado! Se você chegar aqui eu consigo finalmente voltar pra casa! Não fale sobre isso com ninguém! Até porque não vão acreditar em você e vão achar que está louco é claro! Eu estou bem Silas, e amo este lugar! Só que fiz algo errado e agora estou preso aqui, na entrada para cá lhe será entregue uma pedra e você deverá trazê-la pra mim! Só isso e eu poderei voltar pra casa e viver minha vida normal entre os dois mundos numa boa! Vou poder casar com sua irmã, trabalhar no observatório e ter um portal dentro da...
Ops, estou falando demais.
Foi mal pelo susto da brincadeira do locutor meu querido!
Hahaha! Abração Silas! Conto com você! 
Câmbio desligo!

Então o ventilador volta a girar rápido e o rádio começa tocar uma música ruim que é o que normalmente estaria tocando numa rádio, tudo voltou ao normal menos o Silas é claro, que ainda pasmo se pergunta ;

- Eu realmente vivi isso? Eu realmente...

E então uma buzina toca na entrada da casa seguida de um grito de mulher;

- Ana Lúcia! Silas! Mamãe e papai “chegooouu”!!!

E senhor Salvatore pai de Silas e Ana Lúcia repreende sua esposa como de costume;

-  Precisa fazer um escândalo ridículo desses na porta da casa da menina sua mulher louca? Parece um frango morrendo! Que vergonha!

Mas dona Altéia como sempre retruca a favor de sua devoção e amor exagerado e escandaloso pelos filhos;

- Eu grito de amor ao contrário de você que só grita de raiva seu véio amargo! Só resmunga igual uma porta velha! Minha menina precisa de ânimo, de buzina, de grito de alegria da mamãe, de pudim de chocolate tá!? Eu vou lá com minha boneca se você me dá licença! 

E dona Altéia vai abrindo a porta do carro enquanto senhor Salvatore grita de raiva por ter que parar de estacionar o carro para ela poder descer.

Silas vai abrindo a porta da casa enquanto Ana Lúcia avisa de dentro do banheiro que já está para sair, Silas apenas tenta esquecer por alguns minutos o que acabou de acontecer para  poder receber os pais com o mínimo de normalidade possível e dar qualquer desculpa para se retirar por um tempinho e analisar com calma os desenhos que estavam no livro do Saci.

- Mamãe! Que bom que já chegaram! Foi bem de viajem?
Pergunta Silas segurando sua ansiedade 

E Dona Altéia já vai abraçando seu filhinho e despejando suas malas pela sala;

- Oi meu docinho, meu soldadinho de ouro! Eu estou ótima, você que está magro e amarelo demais! Está escovando bem estes dentes? Por que eu to vendo daqui e sua  gengiva tá escura demais! Seu cabelo tá ridículo né? Parecendo uma peruca de palhaço! Cadê sua irmãzinha? Minha florzinha do campo de deus? Cadê?

- Tá tomando banho mãe, poxa mãe, soldadinho de ouro... minha nossa quando que a senhora vai parar com essas coisas?

- Xiiii sai pra lá você também! Tá ficando velho tá ficando igualzinho seu pai! Igual uma porteira velha rangendo o tempo todo.

E dona Altéia bate na porta do banheiro chamando Ana Lúcia

- Docinho! Mamãe chegou! Pode abrir a porta que a mamãe te abraça peladinha mesmo! Igualzinho quando você nasceu!

 E senhor Salvatore vai entrando carregando mais malas e sacolas cheias de comida;

- Minha nossa senhora do céu, é eu chegar perto dessa mulher pra eu ouvir uma besteira que não tem sentido! Isso é jeito de falar com a menina Altéia? Ela já é uma mulher!

E dona Altéia responde bem alto;

- Não tem sentido pra quem não sabe que neném nasce pelado seu matuto ignorante! Eu falo como quero com meu neném.

E Silas pergunta em tom irônico enquanto ajuda o pai a carregar as coisas para a cozinha;

- E aí papai! Viajem divertida?

E senhor Salvatore responde mais sorridente;

- Meu ouvido do lado direito tá cada vez pior, então eu abri a janela pra ouvir o barulho da estrada e o motor do carro que anda um pouquinho barulhento, então ficava bem difícil de ouvir sua mãe, foi a nossa melhor viajem em muitos anos meu filho pode ter certeza!

E senhor Salvatore e Silas dão uma longa gargalhada e um longo abraço de saudade.

Enquanto isso Ana Lúcia vai saindo do banheiro enxugando seu cabelo;

- Oi papai, oi mamãe!
Diz ela forçando um sorriso

Então dona Altéia dá um grito mais histérico do que de costume 

- Meu deus minha princesa o que fizeram com você? Você tá magra tá chupada! Tá parecendo uma criança abandonada com sede e fome, ai minha nossa senhora  aonde que eu tava que deixei minha filinha numa situação dessas meu deus!? Sua casa tá tão suja que só deu pra eu saber que não estava na esquina no meio do lixo porque eu passei pela porta de entrada minha filha! Você está vivendo um inferno imundo e abandonado!

E Ana Lúcia diz;
- E desde quando você me vê depois de um ou dois meses e não diz que eu estava morrendo antes de você chegar mamãe?

Mas Dona Altéia nunca se dá por vencida e só ouve o que realmente quer esculachando tudo e todos do jeito mais absurdo possível.

- Não importa o que você pensa minha filha, você estava abandonada a mais de um mês! Seu namorado sumiu e você ficou aqui solitária! Mamãe devia ter se esforçado mais ainda pra poder ter vindo antes!
Aonde estava seu irmão nos seus momentos de dor? Vadiando aposto! Jogando aqueles jogos imbecis com os amigos velhos de bermuda dele! Escrevendo as coisas imbecis que só ele e os amigos imbecis dele conseguem rir? Desistindo de novo de outro emprego de jornalista para insistir nessa coisa idiota de escrever essas maluquices e abandonar a irmã que perdeu o namorado!?

E dona Altéia então vira com um olhar furioso para Silas e se vira de volta para continuar arrumando coisas no sofá, e Silas fechando os olhos e tentando não gritar como a criança que sempre foi diz chateado;

- Mãe, eu escrevo crônicas, eu me formei em letras, eu sou um escritor, jornalismo sempre foi um bico! Faço as pessoas rirem com os absurdos que escrevo! Já me inspirei várias vezes na senhora em livros que venderam até que bem, lancei meu sexto livro de crônicas e você em algum momento ficou orgulhosa de mim? Não! Está sempre furiosa e preocupada! 
A senhora é um furacão de dramas e problemas mãe! E aonde tá o Ricardo agora? Heim? O orgulho da mamãe deu uma de super homem pra salvar o namorado da mana? Tirou grana da orelha pra fazer alguma coisa? Ou só te comprou uma televisão maior que seu pôster do Roberto Carlos?
Agora EU estou aqui! EU comecei um dia maluco na minha vida hoje por causa dessa merda toda! Não podia ficar aqui com a Aninha mas nos falamos sempre por telefone! Eu sempre sei o que está acontecendo!

E quando Silas acaba de dar seu enorme e chato discurso ele se dá conta de que dona Altéia estava fazendo outra coisa e ignorando tudo que ele tinha falado, pois devido as discussões serem sempre as mesmas ninguém mais ouve ninguém e todos continuam fazendo as coisas como se não estivessem discutindo nada demais. Na hora até parece que dona Altéia está realmente dando atenção para a bronca mas ela faz isto involuntariamente como um cachorro que ladra ao ver a moto passar.

Ana Lúcia continuava enxugando o cabelo e falando sobre o telefone que não toca, senhor  Salvatore estava guardando as coisas no armário e falando alguma coisa sobre motoqueiros e dona Altéia arrumando coisas pela sala enquanto reclamava sobre ninguém da delegacia prestar e o Brasil não trabalhar direito e ninguém no mundo fazer nada correto por tanto o namorado da filha dela continuava sumido e o salário mínimo continuava uma porcaria. Mas ela dizia que graças a deus ela estava lá para poder fazer pudim de chocolate para todos e a filinha dela nunca mais ficaria abandonada como ficou.

Então Silas se deu conta de que se ele pegar a mochila bem devagar e sair de fininho ninguém iria notar.

E foi o que ele fez.

Saiu da casa e chamou o primeiro táxi que viu e foi pra seu apartamento aonde poderia analisar tudo com mais calma;
Definitivamente só o que importa para Silas é entender essa coisa toda, como aquilo podia ter acontecido, claro que não foi loucura! Silas não acredita em surtos de loucura assim sem mais nem menos! Nunca lhe aconteceu nada parecido antes, a não ser coisas e cenas estranhas que via quando criança, mas que por repreensão dos pais e dos irmãos acabou traumatizando tanto que esqueceu da maior parte das coisas que via.

 Ele se pergunta se era mesmo o Ezekiel falando pelo rádio? Será que aqueles desenhos realmente podiam leva-lo a ele? Como o tempo ficou lento daquele jeito? E se realmente fosse o Ezekiel como ele podia saber que Silas já havia encontrado os desenhos dentro do livro?

El então tira os desenhos da mochila e mais uma vez analisa cada detalhe enquanto não chega em casa e desta vez entendendo que as árvores com bolinhas amarelas eram pereiras e dando agora mais atenção a isso notou que debaixo de todas elas tem uma pedra com um círculo desenhado dentro.

Mas infelizmente, assim como tudo que está acontecendo, aquilo ainda é muito confuso para Silas e isso é só mais um sinal estranho no meio destes desenhos tão mau feitos, ele realmente não consegue ter lembrança alguma sobre nenhuma pereira que ele conheça, cada vez fica mais difícil de ele entender como aquilo poderia leva-lo até Ezekiel.

Ele pensa que chegando em casa ligará para sua irmã para avisar que voltará amanhã de manhã para a visita de seus pais pois teve trabalho urgente para fazer;


O táxi então alcança seu destino e Silas num salto paga a corrida ao motorista e corre para casa, vai abrindo a porta e largando sapato e blusa pelo chão da sala, senta perto de sua estante e começa a vasculhar suas anotações enquanto já se prepara para abrir com mais calma o livrinho do saci deixado por Ezekiel.

Quando Silas se vira para procurar seu chinelo ele bate o olho no pé da cama e vê o par de chinelos perfeitamente lado a lado sobre um tapetinho laranja que ele nem lembrava mais que existia, sua cama estava impecavelmente arrumada, sua estante e seus quadros, suas anotações, suas roupas, até mesmo os cabos e fios dos aparelhos eletrônicos estavam bem organizados, ele então correu para a cozinha e viu que toda a louça estava lavada e guardada, o chão do banheiro, a privada, o box e até mesmo o teto do banheiro estavam limpos e cheirosos, Silas então ouve um barulho de algo caindo por detrás vindo da porta da lavanderia, quando ele se vira simplesmente não pode acreditar no que viu de relance, era seu gato Cometa parado sobre duas pernas recuando desajeitado com o pelo arrepiado e olhar arregalado e que num pulo torto rapidamente ficou de quatro e começou a miar loucamente como havia feito naquele dia pela manhã.

Silas se arrepia todo pois teve certeza de que o gato estava de pé e ereto como se segurasse alguma coisa e se arrepia ainda mais ao lembrar de ter desejado que Cometinha arrumasse a bagunça que fez logo assim que saiu de casa.

Ao chegar perto do bichano que apenas miava e se esfregava em sua perna, ele repara que perto do gato estava um amontoado de roupas sujas e sua máquina de lavar estava aberta com outras roupas lavadas prontas para serem penduradas.

Silas então se abaixa, pega seu gato no colo e olha bem fundo em seus olhos;

- Cometinha! Cometinha meu amigão, fala comigo! O que aconteceu aqui? Eu te vi de pé mesmo? Você que estava lavando essas roupas?

E o gato começa a lamber a mão de Silas e a ronronar como sempre fez, como se nada tivesse acontecido.

Silas espantado com a possibilidade de acreditar no fato de seu gato ter arrumado a casa com a certeza de tê-lo visto em pé, resolve enfiar a cabeça debaixo da água fria e pensa seriamente em visitar um médico, e enquanto estava com a cabeça debaixo d’agua o telefone toca, Silas já imagina que é sua irmã ou sua mãe muito brava por ele ter sumido sem falar nada, ele já estava com todas as desculpas na ponta da língua;

- Alô?

E uma voz feminina inesperada responde
- Alô? É o Silas?

- Ele mesmo, quem gostaria?

- Silas! Sou eu! Esqueceu minha voz foi?

Silas então dá uma gargalhada envergonhada

- Leda! Claro que sei quem é! É que eu esperava que fosse minha mãe ou minha irmã!

E Leda diz se desculpando
- O meu querido! Quer que eu ligue outra hora pra você poder esperar a ligação delas?

- Não tudo bem! De forma alguma! Eu estou precisando respirar um pouco mesmo! E aí minha amiga o que me conta? Mais de um mês que não nos falamos né!?

- Pois é, mais de um mês que não nos falamos nem nos vemos, tenho muita saudade!

- Eu também Ledinha, ando precisando muito falar com você, é uma doideira você sempre aparecer nas horas que preciso tanto falar com alguém que possa acompanhar meu raciocínio. Mas particularmente agora a coisa tá mais doida e séria do que qualquer outra coisa que já tenha acontecido na minha vida! Agora mesmo estava me controlando pra não pirar!

E Leda pergunta 
- Você se controlar para não pirar já é normal! Mas me diga então a coisa tá mais doida que a bagunça com os detetives americanos no caso do ET de Varginha?

- Pior que sim... mais doida até que aquela loucura toda em Quixadá. Na verdade acho que digo que é mais doido que tudo isso porque parece que está atingindo diretamente a mim, e eu, ando vendo e ouvindo muitas coisas, realmente precisamos nos encontrar para conversar.

E Leda diz preocupada
- Pois eu também preciso demais falar com você sobre um tanto de coisas, mas me desculpe se estou acrescentando esquisitices ao seu dia estranho, mas estou te ligando principalmente para passar um recado de uma pessoa desconhecida que me apareceu esses dias.

E Silas leva as mãos para a cabeça e pergunta apavorado;
- Não me diga que algo estranho te aconteceu hoje também? Cuidado Ledinha! Será que é aqueles detetives americanos do caso de Varginha? Eu não tinha pensado nisso até você falar agora! Será que são eles que estão me causando alucinações? Sequestraram o namorado na minha irmã? Falaram o que pra você Leda? Por que você falou deles logo de cara? Ai meu Deus do céu o que é que eu fui fazer porque não fiquei com as crônicas desde o começo!? Droga de carreira! Droga de faculdade!

E Leda acalma Silas que estava em prantos falando sem parar

- Calma Silas! Calma nego! Não é nada disso! Não tem detetive nenhum, ninguém desconfia de ninguém! Calma!
 Na verdade nem foi hoje que me aconteceu, foi ontem que um velhinho com um rabo de cavalo comprido tocou o interfone e pediu para que eu descesse no hall do prédio pois não podia levar muito tempo, disse que não podia falar diretamente com você então me deixou um pacote e disse para que eu te entregasse. Eu perguntei pra ele por que ele não podia te entregar diretamente e porque justamente eu deveria faze-lo, então ele disse que assim era o destino e que eu era a única coisa que poderia acalmar seu coração em momentos tão diferentes e difíceis ele pediu para que nos encontrássemos pessoalmente e que eu lhe fizesse um convite.

E Silas então tentando conter o choro de nervoso que ainda sentia, procurando encontrar um pouco mais de calma ao tentar esquecer os detetives do caso Varginha.  Pergunta;
- Velhinho com rabo de cavalo? Pelo amor de deus Ledinha! Me fala logo que convite que ele fez?

- Sei que parece que você não está podendo parar para descansar agora, mas na verdade ele pediu para que eu te convidasse para o sítio da minha avó lá em Minas Gerais, não entendi como ele conhecia minha avó e como podia ser coincidência o fato de eu ter acordado naquele dia pensando no sítio e pensando em te ligar para te chamar para lá passar o final de semana. Doido né!?

E Silas sente um calor interno e seu pranto cessa automaticamente, então ele pergunta;
- Meu deus, mas que loucura, que coisa mais esquisita é essa? Espero que não tenha nada com aqueles detetives malditos mesmo. Você abriu esse pacote? Viu o que tem dentro?

E Leda diz se desculpando
- Mas que droga que eu fui falar desse caso Varginha heim? Me perdoa amado! E claro que não abri o pacote, estou esperando você para abrir!

E Silas impaciente insiste com Leda:
- Então pare AGORA de esperar e abre este pacote que eu quero saber logo o que é.

Leda então abre o pacote rapidamente pois também já não se aguentava de curiosidade e fica em silêncio por um tempo procurando se não tem algo mais na caixa.

Silas pergunta aflito
- E aí Leda? O que é que tem aí?

E Leda responde mais intrigada ainda com o excesso de “coincidências” e esquisitices;

 - Cara, tem uma pêra aqui dentro. Só isso. Uma pêra verde ainda... E o sítio da minha avó se chama Sítio das Pereiras, meu avô vendia frutas quando era vivo e o sítio deles tem um pomar imenso. Que viajem né! Que velhinho sinistro! Não me deixou o nome dele nem contato algum, veio aqui me deu a caixa e me falou isso. Parece que é pra gente viajar junto mesmo heim gato? Comer umas frutinhas frescas? Tomar um cafezinho da vovó, que tal?

  E Silas basicamente em choque quase não se contem de tanta emoção ao responder

 - Meu deus, minha nossa Leda! A pêra, a pereira meu deus do céu! O Ezekiel, o rádio, a voz! Você não faz ideia da loucura minha amiga, acho que eu vou vomitar de tanta emoção!

E Leda interrompe Silas que estava completamente eufórico.
- Ei ei ei Silas! Calma aí meu querido, vc tá demais! O que que foi? Me explica com calma!

 E Silas sem explicar nada apenas pensa em encontrar com Leda o quanto antes
- Leda, você pode vir aqui? Rápido! Acho que vai ser mais seguro se você vier.

E ela responde pronta e sem demora

- Estou chegando gato. Na verdade eu já estou no caminho a alguns minutinhos!

 E Silas vai tomar um banho e preparar um chá para ver se controla a tremedeira enquanto espera Leda chegar, ele liga o rádio bem alto pois uma sensação estranha e profunda de medo tomou seu coração e Silas percebe que não tinha essa sensação desde muito pequeno, desde quando ele tinha sensações e visões estranhas que faziam sua irmã chorar de medo, seu irmão mais velho lhe caçoar e sua mãe lhe dar bronca por inventar coisas para assustar os outros.

Ele sente todo este medo congelante misturado com uma fé e confiança no desconhecido que ele nunca nem sequer ousou pensar em existir, quem dirá em possuir.



Enquanto isso, na Tenda de Estrelas...

Sob um Abacaxiteiro demasiadamente enorme está sentado um gigante que encontra dois papéis que para suas proporções gigantescas são coisinhas minúsculas impossíveis de se ler.
Então ele resolve acordar a gatinha que estava dormindo em seu sapato (que também é menor do que já poderia ser para seu tamanho todo), ele quer saber se ela pode ler aqueles papéis pra ele. 


- Ô gatinha! Gatinha danadinha caroneira dorminhoca! Uhuuu
Chamava o gigante com sua voz desajeitada bufando sobre a gatinha 

A gata Zara que estava por acordar com a vista embaralhada pelo sono, esfregando os olhos para enxergar melhor entende que o vento quente vem da respiração do enorme gigante que lhe fitava bem de perto enquanto ela acordava.

- Bom dia gatinha danada de roupinha! Tava tirando soneca no meu pé é!? Dormiu foi um tempão!
Diz o gigante com sua voz grossa e meiga

A Gata Zara então se ajeita, bate a poeira de sua roupa e diz;

- Saudações gigante guerreiro das montanhas! Como posso lhe agradecer pela carona tão sonora e segura?

O gigante então responde;
- Xiiii gatinha titica, sabia que isso ia acontecer! Não to ouvindo bulhufas do que você tá falando, vem aqui no meu ombro perto do meu ouvido.

E o gigante pegou a gata Zara e colocou-a no seu ombro afim de ouvi-la melhor

Ela novamente se ajeita e diz

- Aham, pois bem senhor gigante, quero apenas saber como posso agradece-lo pela carona e também gostaria de saber aonde estamos!

O gigante então responde

- Como agradecer já está fácil, é só ler pra mim o que tem nestes papeis aqui que acabei de encontrar olha só, são pequenos demais pra mim.

E o gigante mostra os papéis para a gata Zara que está tão pequena que poderia se cobrir cinco vezes com um dos papéis.

O gigante então segura a gatinha acima dos papéis e se abaixa bem pertinho para conseguir ouvi-la.
As primeiras sentenças estavam borradas mas a gata Zara pode ler o restante que dizia;

 “Os portais entre as dimensões do Plano das Tendas Estreladas são os mais vulneráveis de todos os planos paralelos das galáxias, o que leva muitos a pensar que seus portais são protegidos por algo além que seus guardiões.”

A gata Zara então interrompe a leitura;

- Eu não vou continuar a ler essa anarquia! Eu sou uma voluntária das missões dos portais aqui das Tendas e sei muito bem o trabalho que imbecis como este que perdeu essas anotações nos dão! No mínimo é algum infeliz que se enfiou aqui por curiosidade e agora já virou comida de Porcrodilo!

E o gigante retruca não mais tão sorridente assim;

- Haaa então a gatinha tampinha não vai ler é? Pois saiba que posso lhe dar uma carona de volta para aonde veio, só que desta vez vai ser aérea. Eu sou o melhor arremessador da liga de arremesso de crânio de orca voadora da tribo sol das montanhas leste 01, senhorita voluntária guardiã que não tá guardando nem o próprio rabo uma hora dessas!

Então a gatinha apenas se ajeita na situação pendurada e desconfortável em que se encontra e continua a leitura sem hesitar mais com seu amigo grandão;

- Hunf, pois bem;

“Apesar de este ser o plano com um dos maiores indícios de invasões terrenas através dos portais, o plano das Tendas permanece estranhamente isento de colônias terrestres e visitas periódicas de cientistas, militares e outras formas de pesquisa e conquista terrena.

Alguns planos estão habituados a este tipo de relacionamento e já fornecem de suas tecnologias e conselhos aos líderes terrenos que estabelecem conexão com seus povos.

A Tenda de Estrelas é um espelho das maravilhas que a humanidade quis fazer mas teve medo de tentar e muitas vezes de continuar a pensar em poder fazer ou ser verdade. Também é um reflexo do que a humanidade poderia ter sido antes mesmo da sua criação ter sido iniciada. Por isso também existe quem diz que o Plano das Tendas é uma zona de experimentos abandonada à mais pura sorte depois que o projeto “Experimento Humano” falhou.

 Porém, assim como todo espelho o Plano das Tendas carrega suas distorções e reflexos indesejados, e muitas destas manifestações são seres carregados de orgulho e ganâncias que transcendem suas naturezas e abusam de suas capacidades fisiológicas tornando-se criaturas poderosíssimas que acabam por ser confundidas com Deuses ou Demônios pelos visitantes terrestres e outras criaturas das galáxias.

Estes seres costumam nos assistir de longe sem intervir diretamente em nosso percurso terrestre, mesmo que eles acreditem em algo que ainda não entendi muito bem e ainda não constatei veracidade histórica, pois alegam ser os antigos bípedes predominantes da vida terrestre e seu DNA é um dos que foi misturado ao de outras criaturas que despertavam interesse no experimento humano e que de certa forma são responsáveis por nos colocar de pé e nos permitir pensar e falar. ”




E a gata Zara dá uma longa gargalhada ao terminar a leitura;

- Ha! “Experimento Humano” mas que lorota mais manjada! Esse papo é velho pra nós que somos daqui! O que não falta é teoria sobre isso. Você não acredita nisso não né senhor gigante?

E o gigante sorrindo olha para Zara e então olha para o céu e diz;

- Como não vou acreditar se eu sou um dos resultados de um dos bilhões de experimentos?
Você é resultado dos reflexos posteriores gatinha, nós somos experimentos que foram introduzidos certa época na terra e que agora que já não cabem mais lá, estamos destinados a vagar por estas terras sustentando a união de nossas poucas tribos restantes espalhadas entre o Plano das Tendas Estreladas e o Plano das Lendas.

 E a gata Zara continua confusa;

- Não sei do que você está falando. Como podem aceitar ser meros experimentos? Do que você está falando? Eu achava que a tribo dos gigantes guerreiros era composta por criaturas fiéis aos caminhos da magia. Você está me surpreendendo. Convivo com feiticeiros por centenas de anos e ainda não ouvi falar e nem vi evidências sobre estes experimentos. 

E o gigante retruca;

- Pois talvez seja por isso que não tenha ouvido relatos de experimentos e também que não me entenda, centenas de anos não são suficientes nem para entender criaturas frágeis como os humanos quem dirá entender que ter sido criado através de um experimento não significa não ter conexão com as fontes de energias naturais.
Somos tão conectados com as forças da natureza como qualquer outro, minha aura existe e funciona como a sua, meu corpo está habitado e nós nos alimentamos e respiramos da mesma fonte. Apenas este corpo é um experimento. Eu não!

Você convive com feiticeiros arcaicos que protegem um sistema falido sustentado por mentiras e aventuras alquímicas. Não protegem portal algum, não tem controle sobre nada. Nem sobre a própria magia. São centenas de anos confinada no mesmo reinado protegendo os mesmos portais não é mesmo amiga? A quantos anos não saía para uma jornada por conta própria?

 Eu estava indo para a montanha das montanhas quando você subiu no meu pé para pegar carona. Acredito que centenas de anos ao menos sirvam para saber o que gigantes guerreiros vão fazer lá todos os anos não é mesmo amiga titica?

E o gigante volta sua face sorridente para Zara que agora está com uma cara enfezada e com as orelhas deitadas para trás;

- Pois saiba você senhor gigante, que eu convivo com feiticeiros que mantém os códigos em funcionamento e as palavras em perfeita harmonia para que todo o plano aonde você pisa seja protegido e funcione harmoniosamente sem cair perdido no espaço/tempo virando casa de demônio, não tem outra coisa misteriosa segurando isso aqui, somos nós e nós! Os feiticeiros e as bruxas dos bosques! Por isso os humanos não nos dominam! E se você e sua tribo for um experimento sinto muito mas eu não incluiria todos os gigantes neste absurdo que está me afirmando!


Então o gigante arregala os olhos e com o sorriso que tem na cara a maior parte do tempo diz;

- Sem dúvida alguma você e seus amigos são ótimos feiticeiros, então me diga gatinha, o que você faz assim tão exageradamente pequena e viajando sozinha para o Sul? Está me parecendo que você precisa resolver um probleminha que nem você nem seus amigos puderam resolver não é mesmo?

E Zara defende-se indignada com o gigante;

- Eu- eu, eu não pude resolver porque foi um feitiço lançado pelo respeitado feiticeiro Apopeus o Senhor dos Desmemoriados, se eu chegasse ao castelo nestas condições e pedisse ajuda para alguém jamais eu seria respeitada novamente entre eles. O que já dá um grande trabalho pois sou o único felino que hoje em dia trabalha nos laboratórios e eles estão sempre procurando algo para dizer que eu poderia ter feito melhor! São mais de quatrocentos anos vivendo lá e mais de cem anos desejando que os velhos tempos voltassem e os felinos que antes dominavam o Reino da Feitiçaria retornassem a seus postos de glória.

Foi depois disso que resolvi me candidatar a voluntária das missões dos portais das tendas e procuro caçar pessoas que invadem nossas terras ou vagam por aqui de qualquer outra forma sem a devida permissão, se forem criminosos envio-os diretamente ao presídio dos Aquielaianos, pois nenhum outro lugar poderia ser mais disciplinador do que os jardins de Aqui e lá.

- E se não forem criminosos?
Pergunta o gigante

- Então faço o que posso para devolvê-los ao lugar de onde vieram antes que virem comida, brinquedo, ingrediente ou escravos de alguma criatura insana.
Responde Zara.

O gigante então fala com mais entusiasmo;

- Sim! Essa é você, essa que salva as pessoas de problemas é você, a outra que apenas leva criminosos para a cadeia é uma serva triste e cega tão vítima quanto aqueles que você mesma procura salvar das garras de um Panterodonte. 
Você sabe por acaso para aonde foram muitos dos seus amigos gatos? Seus irmãos e irmãs? Toda elite felina dos bosques sagrados e das torres de trepadeiras dos palácios dos bosques Oeste? Claro que você sabe não é mesmo!? São seu povo! Ou também estou enganado sobre isso?

E Zara fica em silêncio por um instante e então diz;

- Eu prefiro continuar fingindo que não sei. A maioria abandonou seus postos, são desertores, não me interessa seus destinos.

E o gigante dá um profundo suspiro e diz;

- Entendo, assim como você ignora o passado que lhe apresentei você também ignora a verdade do porque sua raça se rebelou contra os Mãos Grandes e os prefimperadoreitos. Tudo isso fez com que a elite desconfiasse para sempre de toda sua raça. Você odeia isso porque quer ser a elite não é mesmo gatinha titica?

E Zara responde alterada

- Eu SOU a elite da feitiçaria junto de tantos outros feiticeiros e isso nunca mudou! Quem mudou foram eles! Eles mudaram! Se rebelaram contra lendas tal qual o erro dos humanos e de tantos outros planos que sustentam guerras infinitas. Eu não fiz parte desta decisão burra porque eu sabia que ia acabar aonde acabou!

-E aonde acabou gatinha?
Pergunta o gigante

- No esquecimento! No nada! Ninguém mais fala deles! Ninguém mais lembra do que fizeram! Se não fosse por mim nos laboratórios as mais sagradas fórmulas felinas teriam sido extintas, milhares de milênios de trabalho perdidos por pura rebeldia e uma história burra e repetitiva. Eu não podia deixar isso acontecer amigo gigante! Não podia mesmo! E mesmo assim ninguém me dá o devido respeito e valor! Veja agora por exemplo! Eu neste tamanho ridículo dando satisfações para um gigante que se diz um experimento e que só abriu a boca pra me provocar!

E o gigante responde com seu sorriso

- Pois então sem dúvidas agora é a hora não é mesmo?

E Zara confusa pergunta

- Hora? Hora do que? Hora de onde? Eu deveria era estar bem longe de você uma hora dessas isso sim! Seja lá a hora do que for pra você!

 E o gigante mantém sua educação e seu sorriso

- Hora essa minha amiga felina, você não faz ideia de como deveria estar comigo! Está na hora de você saber aonde está não é isso que havia me perguntado? E também está na hora de me dizer se sabe o que os gigantes guerreiros fazem todos os anos nas montanhas das montanhas.

E Zara se arruma um pouquinho, dá uma olhada ao seu redor e diz;

- Pois bem, eu sei que os gigantes guerreiros caminham todos os anos para as montanhas das montanhas para passar frio por sete dias no seu topo e depois cozinhar seu corpo por mais sete dias em seu interior. Isso faz com que vocês mantenham a imortalidade não é isso?

E o gigante responde com seu bom humor

- Isso! E também com que mantenhamos esta pele macia e esses lábios carnudos de gigante! HAHA! Brincadeira! A Imortalidade é só um mito dona gata, fazemos este processo por que é a única forma de falarmos com a montanha.

- Minha nossa! Não existe forma menos dolorida de se falar com uma montanha não? Conheço milhares de elementais que falam com a natureza sem precisar furar um dedo.
Diz Zara ironicamente

- Não é a mesma coisa com a montanha das montanhas gata, você deveria saber disto sendo a feiticeira que diz ser. Ela é a senhora de todas as rochas e minérios. Nada na natureza é tão grandioso.
Retruca o gigante

- Eu sei disso meu caro, estava lhe caçoando. Já que você se atreveu a me provocar de tantas formas posso me atrever a perguntar o que vocês conversam com a montanha das montanhas todos os anos?

E o gigante para por um tempo e então começa a segurar uma forte gargalhada e diz com dificuldade;

- Eu não lembro! Haha! Essa é a melhor parte gata! Ninguém lembra de nada! Hahaha!

- Você só pode estar me caçoando, como assim não se lembram?
Pergunta Zara já considerando uma perda de tempo estar falando com aquele ser descontrolado

- Não lembramos pois a grande mãe diz que não suportaríamos tamanha informação e precisamos absorver ao nosso tempo, talvez por isso acabamos vivendo mais e absorvemos com mais facilidade detalhes pouco populares, pois eles já estavam gravados em nosso DNA depois das conversas de quatorze dias, porém viver por mais tempo não é o intuito verdadeiro, é apenas uma consequência de uma busca nobre e natural. 

Não damos nome para esta busca nem nos preocupamos aonde ela vai dar. Apenas nos conectamos com estas informações e interagimos com a evolução nossa e dos nossos arredores a nossa maneira. As respostam brotam com a naturalidade dos fatos. É inevitável.

Disse o gigante levantando-se e ajeitando as costas fazendo com que o barulho que Zara ouvisse fosse mais parecido com um estrondo de tempestade do que com costelas estalando.

- Dona Gata...
Continuou o gigante
- Não importa mais toda esta racionalidade teimosa que você insiste em forçar, você está sozinha agora e está numa busca, você foi predestinada no meu caminho, o velho da minha tribo disse que na minha bota eu encontraria a ferramenta para ler os pequenos papéis que encontraria debaixo do tremendo abacateiro. E quando chego aqui e encontro estes papéis minúsculos impossíveis de se ler, vejo você dormindo entre os buracos da minha bota.
Você escolhe no que acreditar gata, eu estou seguindo meu destino mas estou disposto a ajuda-la se me acompanhar até o fim de minha jornada.
E aí, topa?

E Zara responde confusa;

- Eu não entendo! O que você ainda quer comigo? Você me contradisse tantas vezes que não consigo entender porque deseja ter alguém ao seu lado que procura viver e pensar tão diferente de você. Por acaso o velho da sua tribo teve alguma premonição sobre isso e você está se forçando a se oferecer para me ajudar e a me convidar para sua jornada?

E o Gigante disse seriamente
- Acredite em mim gata, é justamente por ser tão diferente que preciso de você ao meu lado, algo finalmente novo está acontecendo desta vez, diferente de todas as vezes em que coisas novas aconteceram, e acredito ter tudo a ver com a definitiva revelação sobre as informações que você leu naquele papel pra mim, e também com a presença de alguém que ainda não tenho certeza se é a mesma pessoa que “perdeu” estas anotações, mas sei que estes são fatos que estão dando início a uma nova era de informações ao povo das Tendas.

Zara arruma seu chapéu e dando um sorriso irônico diz;

- Pois que seja gigante! Você me despeja suas premonições e loucuras, me dá carona e me ajuda com a poção que preciso e eu faço um passeio contigo até a Montanha das Montanhas que é uma lindeza de lugar. Fechado. Com certeza não tenho nada a perder, mas confesso que prefiro você assoviando.

E o gigante responde meigo e educado

- Pois eu gostei de você dormindo e  também acordada, acredite gatinha, sei que é difícil de acreditar mas sei que seremos bons parceiros! Agora suba na minha mão que vou te erguer mais ainda pra você ter mais noção de onde está.

E Zara responde enquanto sobe na mão do gigante

- Bons parceiros! Sei, sei! Então talvez pra começar você deveria saber meu nome e eu o seu pra você parar com essa coisa horrível e me chamar de gatinha! Tenho Quatrocentos e oitenta e cinco anos, me chamo Zara. E você gigante como posso chama-lo?

 E o gigante sorridente responde bem humorado

- Puxa vida, achei que podia ser gatinha mesmo, por mim você pode me chamar como quiser, de gigante mesmo, senhor grandão, mas meu nome de nascença é Dadaim.

E Zara diz intrigada

- Dadaim!? Tudo bem, seu nome é seu nome e vou chama-lo assim! Mas me diga então, se você é um experimento como tem nome de nascença? Seu nome não deveria ser um número com algumas letras perdidas no meio de traços, barras, asteriscos ou algo do tipo?

E Dadaim responde 

- Eu fui inseminado no útero da minha mamãe gigante que já era um experimento oras! 

E Zara tentando não parecer tão incomodada com aquela loucura toda parou de falar por um momento, e segurando seu chapéu olhou ao seu redor e exclamou surpresa;

- Minha nossa mas que planície mais maluca! Que rochas são essas? Aonde estamos?
Ela avista no horizonte formações rochosas azuis e verdes aonde parte flutuava e parte permanecia no chão estranhamente equilibrada.

- Nós estamos nas Planícies de Alpiel, no extremo do bosque norte, estamos a três dias do bosque Sul.

Então o gigante se agarrou em um dos galhos do Abacaxiteiro e erguendo mais alto ainda a gata Zara ele disse:

- Zara! Olhe bem para aquela rocha pontuda com a ponta branca entre aquele enorme círculo de árvores, me diga o que vê ao redor dela.

E Zara força a vista ao máximo e vê apenas pontinhos voando ao redor de um pico rochoso

- Acho que estou vendo aves sobrevoando uma pequena montanha flutuante, nada demais! É difícil demais de enxergar coisas distantes estando deste tamanho meu caro!
Então Dadaim explica

- Aquilo são as crianças voadoras minha cara, são as Estrelas Matutinas.

E Zara arregala os olhos para Dadaim com a boca aberta

- Não pode ser! Você só pode estar brincando. As Estrelas Matutinas ascenderam às galáxias e mantém o equilíbrio das energias entre os planos sem precisar estar dentro da nossa atmosfera. Elas voam com seus brinquedos pelo espaço já fazem algumas centenas de anos!

E Dadaim responde firme e confiante como de costume

- Pois eu lhe digo que aquelas são as mais puras Estrelas Matutinas e é exatamente para lá que estamos indo antes de prosseguir nossa caminhada!

- É mesmo!? Essa eu quero ver então! Se for verdade você terá muitos créditos comigo!
Disse Zara ajeitando-se no ombro de Dadaim

- Pois prepare-se pra jornada minha amiga, a jornada dos créditos! Pois tudo que eu falo é verdade!
Disse o gigante seguido de uma alta risada 

E os dois caminham em direção as “estrelas matutinas” enquanto Dadaim assovia uma canção que fez Zara sentir algo quentinho dentro de sua barriga, deixando uma estranha e cômoda sensação de segurança e carinho, algo que ela não sentia a muito tempo.



Enquanto isso no Condomínimo das Fadas e das Pêras no extremo Sul do reinado dos bosques das Tendas;

De dentro do palácio das Fadas Ladras a Rainha Agrafena anda de um lado para o outro sabendo que sua fiel escudeira Ÿorn havia sido capturada de alguma forma em algum lugar, por sorte da rainha e  por descuido de dona Matinta, a velha feiticeira utilizou um punhal encantado, no caso o “punhal vivo”, qualquer artefato enfeitiçado ou mágica usada contra as mensageiras da rainha são imediatamente identificados na consciência de Agrafena revelando assim também a pessoa que utilizou  aquela magica ou artefato no momento.

Matinta foi identificada pela rainha mas ela não sabe aonde a velha feiticeira está, mesmo assim pode tentar qualquer coisa a distância contra Matinta para castiga-la por sua audácia, a rainha sabe que Ÿorn está viva mas não tem certeza se está com Matinta ou não, mas para Agrafena isto não importa muito agora, ela já mandou mais cinco mensageiras de reforço para a missão, depois que o Sr. Saci já estiver avisado ela irá procurar pela pequena fada, por enquanto ela está preocupada em juntar um enorme exército que já se reúne no pátio central do Condomínimo das Fadas e das Pêras mesmo sem saber o porque estão se reunindo.

Enquanto voa rapidamente pelos corredores do palácio sentido ao pátio, a Rainha reclama com uma de suas muitas escudeiras;

- Maldito bloqueio de telepatia do Sr. Saci, tanto atraso poderia ter sido evitado se não fosse essa maldita tradição de cartas enfeitiçadas! Eles não confiam nas fadas!

E a fada escudeira pergunta

-   Talvez não confiem nas Fadas Ladras minha senhora, e quanto a estas cartas enfeitiçadas, elas são enfeitiçadas exatamente pelo oque?

E a Rainha responde espantada

- Me surpreende muito que não saiba que as cartas são enfeitiçadas para que o Sr. Saci saiba que a informação ali escrita foi exclusivamente de primeira mão para ele, e se qualquer outra pessoa tentar ler antes dele, o que provavelmente já pode estar acontecendo, ele receberá um aviso telepático de que alguma informação nossa para ele foi interceptada. Talvez até já tenha recebido.

Então a Rainha faz uma pausa com um ar suspeito e pergunta;

- Escudeira! A senhorita por acaso é novata? Pedi para que apenas escudeiras mais velhas me acompanhassem de perto nesta missão, por que raios só agora me dei conta de que não te conheço!? 

E a Fada Escudeira responde;

- Meu nome é Iamara minha senhora, Saí da infantaria a oito meses e fui escalada como escudeira desde então, fiz trabalhos de destaque pelo batalhão por tanto fui confiada em acompanhar a senhora até o pátio central. Perdoe minha ignorância em relação a informações de conhecimento dos de sua confiança minha Rainha.

E  Agrafena então responde;

- Deveria estar se desculpando por não saber o porque esse povo não confia em nós, o fato de sermos as fadas ladras é o de menos, o que realmente os incomoda é que temos mais mágica que eles e não dependemos de certas interferências diretas com humanos para mantermos nossas missões nos planos da existência. Somos a rebelião da pura magia. Na verdade acho que esta parte você já deve saber bem não é mesmo?

E Iamara responde confusa;

- Parte? Qual parte? 

E a Rainha ignora a confusão da fada enquanto acelera o voo ultrapassando Iamara dizendo;

- Espero poder ver seu destaque como escudeira também minha cara, escudeiras reais costumam ler e se informar tanto quanto são eficazes e letais em batalha, espero que seus treinadores já estejam se preocupando com isso. Diga para Alis que venha falar comigo depois que esta bagunça acabar, e é claro, se você sobreviver.

E Agrafena voa para o alto contornando as enormes Jabuticabananeiras Reais que enfeitam os adornos do pátio central, enquanto a fada Iamara voa atrás dela pensando que deveria ter ficado de boca calada desde o início.

A rainha então paira sobre a estátua dourada de “Agaberta” uma antiga feiticeira filha de um gigante notável chamado Vagnoste, Agaberta fora tão poderosa quanto qualquer outro criador de mundos, as fadas ladras a adoram pois tem a certeza de terem sido criadas por ela.

Do topo da cabeça da estátua a rainha contempla seu exército crescendo, a população do Condomínimo das Fadas está inventando todo tipo de estória para o motivo de a rainha querer reunir a todos no pátio central, uns dizem que ela irá anunciar aumento de divisão dos furtos realizados, já que todos entregam tudo o que roubam para ela, e se não entregam ela sempre descobre, outros dizem que ela irá devorar em público os poucos seres do sexo masculino que sobraram escravizados no condomínimo deixando apenas os que servem para determinados tipos de reprodução e os coitados dos domésticos donos de casa de boca costurada, outros dizem que ela irá suspender a “Festa Anual do Dente de Ouro “ , pois a Dona Sara, senhorita feiticeira mãe de todas as Tendas é um ser grandioso que não se brinca, avisou que as Terras Maravilhosas dos Ciganos não suportariam mais fadas brigonas dando murro na boca de cidadãos disputando dentes de ouro por diversão. Isso é pior que uma afronta a cultura de seu povo, isso é motivo de guerra se acontecer mais uma vez; E outros ainda dizem que a rainha vai reunir um exército para pegar de volta os artefatos roubados do seu palácio que se encontram sob domínio dos humanos no Vaticano e em Jerusalém; Mas é mais ou menos quase tudo isso e mais um pouco que a Rainha precisa de seu povo, então ela diz;

- Povo do Condomínimo das Fadas  Ladras e arredores, estou aqui para deixa-los atualizados sobre nosso atual momento de crise, como a história da maldição dos sapoláceos para adentrar o plano dos humanos já não é mais novidade alguma falarei em resumo o que está acontecendo.

Toda a população cessa imediatamente os murmurinhos e se entreolham de olhos arregalados, e então a rainha continua; 

- Um fio de cabelo de um humano enfeitiçado por um servo de um daqueles sapoláceos nojentos foi queimado num papel com a palavra arco íris, vocês já devem saber que isso então começa um processo de conexão do portal arco íris das Tendas Estreladas para a Terra, sabemos muito bem também que eles e mais um tanto de outros povos desprezíveis desejam invadir o Vaticano e alguns túmulos em Jerusalém para recuperar artefatos que foram conquistados com o nosso esforço ao longo destes séculos e que foram descaradamente furtados por aquela escória terrena sem vergonha! Servos dos pequenos demônios burros que a tantas eras rastejam pelos desertos.

Algumas fadas impacientes exclamam entre a multidão;

 - Vamos ataca-los logo então minha Rainha!
Outra fada diz;
- Vamos ataca-los antes que o portal se complete e destruir a entrada do arco-iris!
Outra fada responde;
- Não idiota! Vamos mata-los e deixar o portal se abrir para recuperar nossas preciosidades!

A Rainha então exclama;

- Silêncio por favor minhas caras! Não temos por que nos apavorar. Devemos nos apressar sim, mas nos apavorar não. Como sabem enviei a fada Ÿorn numa missão de mensageira ao plano das Lendas, e o que não sabiam é que nesta carta eu relatava este acontecimento para o Sr. Saci, mas o que não sabem ainda e talvez não tenham entendido quando viram eu mandando mais cinco mensageiras ao plano das Lendas, é que infelizmente a fada Ÿorn foi sequestrada e já tenho a confirmação de outros feiticeiros além deste suposto sequestrador que estão sabendo da importância das informações nesta mensagem.
 Sabemos quantos povos querem invadir a terra para recuperar seus artefatos e inclusive para roubar os nossos, sabemos que o povo dos desertos dos jardins de Aqui e Lá possuem um número absurdo de artefatos aprisionados na Terra por que são uns fracotes descuidados, sabemos que o Prefimperador ridículo e o Prefimperadoreito babaca já estão no limite do abuso dos humanos e se souberem deste portal não tenham dúvidas de que eles e qualquer outro imbecil estarão com um exército enorme nos domínios dos sapoláceos logo logo.

A nossa honra está em jogo e desta vez não devemos deixar esses répteis doentes vencerem qualquer coisa novamente, nem eles nem ninguém mais! 
A população toda aplaude a rainha, fadas levantam lanças e facas afiadas, espadas curtas e arcos dourados, escudeiras batem em seus escudos e pequenos gnomos e outros elementais que servem ao povo das fadas ladras juntam-se ao exército carregados de toda mágica e suprimento necessários para a marcha sentido ao domínio dos sapoláceos.

A rainha então dá as ordens de partida ao seu exército;

- Uniremos o máximo possível de nosso povo, até mesmo os escravos domésticos e os reprodutores de escravos! Marcharemos sentido ao domínio dos sapoláceos que como todos sabem fica a três semanas voando daqui, sabemos que no caminho existem incontáveis sapoláceos que farão de tudo para nos comer e também não podemos esquecer que os ciganos andam meio chateados com agente e a partir de agora a Festa Anual do Dente de Ouro está suspensa, estamos correndo sério risco de chatear definitivamente a Senhorita Sara;
 Por tanto minhas caras, teremos que voar alto e os servos que caminham por terra terão que lutar por suas vidas e andar em grupo, irei disponibilizar três de minhas fiéis escudeiras para acompanhar de cima os grupos que irão por terra, provavelmente chegaremos uns quatro ou cinco dias antes deles, isso se não tivermos muitos atrasos nas paradas de descanso que serão feitas nas mais altas montanhas, teremos uma parada obrigatória de dois dias na montanha das montanhas pois tenho uma velha amiga para encontrar por aquelas redondezas, tenho certeza de que ela irá nos ajudar nesta guerra, ela nos deve mais do que a própria imortalidade.

Então uma das escudeiras pergunta;

- Rainha Agrafena! A senhorita irá aguardar pelo conhecimento do senhor Saci sobre o portal arco iris para podermos partir?

E a rainha então responde;

- Definitivamente não minha cara, ele provavelmente já recebeu a mensagem telepática da carta enfeitiçada avisando que a informação foi interceptada, quando ele finalmente souber o que aconteceu e enviar seus reforços para a terra dos sapoláceos sabe lá o que eles também vão querer com o portal, com sorte nós já estaremos por lá! Por tanto começaremos a marchar quando a sombra de Agaberta estiver apontando para o norte, preparem-se filhas da cria do gigante, as Fadas Ladras declaram guerra e invasão ao domínio dos sapoláceos e ao portal para a terra! Destruiremos o reinado deles e deixando o portal aberto cuidaremos dele para que não se feche, um exército selecionado irá invadir a Terra com o menor alarde possível aos terrenos e não deixaremos ao menos uma testemunha da invasão, nem terrena nem das tendas! Usaremos força total das armas encantadas e da nossa mágica e mostraremos aos planos da existência que merecemos nosso respeito!


Enquanto isso em algum lugar no Plano das Tendas

Dentro de uma pequena cabana suspensa na copa de uma enorme árvore está a fada Ÿorn deitada numa esteira com a barriga enfaixada, suando frio, levemente acordada e ainda com muita dor, enquanto um homem encapuzado, sentado numa poltrona velha e suja em frente a um fogão de barro acende o fogo e coloca água para ferver.



Encarando o fogo enquanto aquece suas mãos, ele fala com a pequena fada mesmo ela estando na condição em que está: 


- Sabe pequena fada, vou lhe dar satisfação da minha missão sobre o por que eu e meus irmãos de jornada defendemos que nossa maior explicação, talvez nossa única chance nesta existência de sabermos definitivamente de onde viemos e por quem fomos criados, talvez nossa única chance de se livrar das funções sistemáticas dos criadores para as quais fomos designados, seria fazer com que todos os seres terrenos enxergassem o milagre de suas almas, e compreendessem a imensidão da sua eternidade em sua essência.

 Sabe do que estou falando né? Daquela primeira bolinha que os criadores fazem quando vão moldar um ser. Para nós é comum. Pra eles é um mistério tão grande que até em religião eles transformam um assunto tão simples e básico, era para eles estarem milhões de anos luz a frente do que estão agora. São seres magníficos... 

Então a chaleira começa a apitar e ele se levanta da velha poltrona para preparar o seu café.
A fada Ÿorn então dá um gemido e começa a se ajeitar na esteira tentando tomar uma posição um pouco mais vertical e o homem deixa a água escorrendo no coador enquanto corre para ajudar a pequena fada:

Então Ÿorn grita:

- Sai! Sai! Não encosta em mim! Você tá cuidando de mim mas sei lá quem você é! Você ainda me raptou! Sai fora! 

E a fada ficando vermelha e perdendo o fôlego por segundos leva as mãos à barriga.

Aaaaargh! Mas que dor maldita!

Enquanto ela geme o homem encapuzado continua a falar:


- Se eu fosse você parava de falar tão alto.

Você tomou uma punhalada de uma feiticeira das piores, sendo que ela abriu sua barriga para pegar sua carta, o amiguinho dela deixou ela nervosa e quando alguém está nervoso na posse do punhal enfeitiçado ele finca fundo quase que incontrolavelmente atrás da alma da vítima, pois o feitiço se alimenta de morte e medo.

 E foi por pouco quase o que aconteceu com você, só que para compensar a morte que não alimentou o punhal a feiticeira sacrificou uma ave. Você só não morreu porque ela não quis danificar a carta. 

Sortuda você pequenina, sortuda sim!
Tive trabalho pra te manter viva. Sendo que você é pouco maior que meu ante braço! Não foi fácil não dona coisinha!

E a fada com cara de dor e espanto tenta gritar sem sucesso novamente:

- A carta!!! Cadê minha carta seu desgra..AAAARGH!  

E o homem diz enchendo uma xícara de café enquanto arrasta a poltrona para mais perto de Ÿorn:

- Calma mocinha! Que exagero de fadinha brava! A carta está aqui, mas o punhal rasgou o suficiente para ela se abrir, acredito que para quem quer que seja a pessoa já deve estar sabendo que ela foi aberta. 

E Ÿorn pergunta espantada:

- Tendas!? O que!? Por Agaberta!  Mas eu entrei nas Lendas! Passei o portal, passei os campos cantantes...

Como você sabe tanto sobre os feitiços das cartas encantadas?

 Me fale agora quem você é e aonde estamos ou não continuamos mais conversa alguma!


E o homem dá um gole no café, tira seu capuz e responde:

- Pois bem, meu codinome é  Sr. Escuridão, faço parte de um grupo enorme de seres espalhados por todo o plano das Tendas que busca entender melhor nossas origens, somos responsáveis pelo Agouro Auspício, intercalamos e selamos a muito custo as informações que os criadores passam  para as aves que transmitem mensagens e sinais aos humanos.
É assim que minha raça interfere na vida dos que nascem na Terra.

E Sr. Escuridão coloca a xícara vazia sob o fogão e completa:

- E sim, você está no Sudoeste do Plano das Tendas.

Ÿorn então dá uma pigarreada e responde:

- Tá, você é um daqueles coroas pirados da irmandade encapuzada que fala que nossa alma foi roubada e vendida para um experimento que deu errado e então viemos parar aqui para influenciar outras raças e escraviza-las em nome de bla bla bla minha barriga maldita dói! Estou cansada demais pra isso, que assunto idiota, pra mim você é um velho idiota! Como pode correr tão rápido se aparenta ser tão velho? Droga de sorte! Devolva agora minha carta! Mesmo rasgada! Eu quero ve-la!

E Sr. Escuridão entrega a carta para Ÿorn que a pega de sua mão com rapidez e logo a coloca entre suas coisas, mas logo volta aos gemidos encolhendo-se em sua posição dolorida e desajeitada na esteira. Tudo o que a pequena fada consegue fazer agora é reclamar e ouvir com certa impaciência a tudo que Sr. Escuridão tem a lhe dizer.
E ele continua:

- Eu imaginava que fadas como você já tinham visto de tudo, achei que não se surpreenderia com um velho que se movimenta com rapidez. Sou mais velho que as sombras dos planetas que nos cercam, mas não sou mais velho que este plano, não me considere um idiota minha amiga, não seria uma escolha sábia para o benefício de sua empreitada, aproveite a estadia enquanto pode, pois acredito que você, assim como todos os encapuzados, sabe que um portal se abriu na conexão arco-íris dos Sapoláceos.

E Ÿorn novamente se esforça em vão na tentativa de falar agressivamente:

- Você! Seu, seu puto! Você leu a carta seu verme seco! Você violou uma regra real e terá suas tripas amarradas em sua garganta por isso, aaaaargh! Me dá uma porra de um balde!!!

Grita Ÿorn enquanto Sr. Escuridão pega um balde para que ela possa vomitar, 
  

- Por favor dona fada, se acalme, a maioria dos que buscam as respostas dos criadores estão sabendo que um portal se abriu na conexão Arco – Íris isto não é mais segredo, já tem muita gente atrás do que vocês estão atrás,  e acredito que sua rainha saiba disso, eu disse que a pessoa sabe que a carta foi aberta pois ela foi rasgada pelo punhal e quebrou um pedaço do selo enfeitiçado, isto já é motivo para o  feitiço acusar violação. Mas se você olhar a carta com calma agora vai ver que ela não foi nem ao menos desdobrada e ainda é necessário quebrar mais do selo para poder abrir completamente, eu não violei nada, apenas já sei o que está acontecendo, é por isso que eu estava no seu caminho, e no caminho da feiticeira que tentou lhe caçar, também não quero que pessoas como ela cheguem até o portal para terra, sei o que estes seres querem com os artefatos que se encontram sob posse dos humanos.

E Ÿorn diz enquanto limpa o rosto e cospe no balde;

- Entendo, e aposto que também não quer as Fadas Ladras perto do portal, e é por isso que me sequestrou!

E Sr. Escuridão responde enquanto pega um pedacinho de papel para a fada se limpar;

- Não! Não mesmo! Muito pelo contrário! Sei que o que as fadas ladras roubam, elas o fazem por conta de sua natureza, assim como um Gatotixa come uma Ratoranha, é instinto! 

 E também sei que os artefatos que os humanos levaram de vocês eram artefatos reais forjados e encantados por vocês mesmas, sei que querem passar por este portal e pegar tudo sem muito alarde pois aquilo é importante demais para vocês, sei que não vão criar confusão a toa com os humanos. A magia que vocês possuem é invejada e admirada em incontáveis planos, sei que compreendem a importância e a responsabilidade disto.

Então Ÿorn agora aparentemente melhor do que antes, responde seca e séria como demonstrou ser até agora;

- Você não sabe nada! Não faz ideia alguma do que é ser uma fada ladra! Este título é uma maldição e o nosso poder é muito além do que já conhecem! Não fazem ideia do porque permanecemos aonde estamos, pois se quiséssemos já teríamos aniquilado seu plano patético, esses Sapoláceos idiotas que nos comem feito moscas, temos que voar alto como insetos assustados! Fugimos como ladras por natureza mas sabemos muito bem o que éramos antes disso! Nossa história e nossos acordos com os imortais e com os mortais vai muito além do que você imagina que sabe velho homem, ou se lá o que vocês encapuzados realmente são.
O que sei é que não preciso de você no meu caminho agora. Vou melhorar e vou sair voando daqui, pode ter certeza disso.
E em forma de agradecimento por ter cuidado de meu ferimento não contarei para minha Rainha o quão ousado que é, e lhe pouparei de ter seus órgãos genitais amarrados a uma árvore por três dias e três noites na festança de comilança de carne masculina em nome de Agaberta.

E Sr. Escuridão cai na gargalhada deixando Ÿorn irritadíssima, mas ainda devido a suas condições permanecia aonde estava. Sr. Escuridão então se abaixa e fala gentilmente;

Minha amiga eu estou do seu lado, acredite em mim, agora se ajude e durma.

E então Sr. Escuridão movimenta a mão sobre sua xícara de café que solta uma densa fumaça negra envolvendo o corpo de Ÿorn que em questão de segundos sem poder falar mais nada cai num intenso e profundo sono,  até que sua ferida possa cicatrizar.



Enquanto isso, em algum lugar no plano das Lendas

Um sujeito poderosíssimo conhecido como Saci e seu fiel conselheiro o Sr. Bode, batem um intenso papo sob a sombra de um Jacajueiro em um espantosamente brilhante campo de lírios cintilantes;

- Como pode tamanha estupidez!? Séculanos e milenitempos de existência, roubando, matando, enganando, fugindo; E essas fadas malditas insistem em cometer erros básicos e estúpidos!
As malditas perderam uma carta de extrema urgência! Um assalto! Um sequestro! Uma pancinha rasgada de uma fadinha descuidada! Sei que é estupidez esperar eficiência do serviço de ladras, mesmo com magia de sobra não deixam de ter por natureza a fraqueza de um ladrão! 
Mas eu sou um cara tão legal não sou senhor Bode? Seus chifres capricornicósmicos não confiam na minha lealdade assim como meu cachimbo confia em seu caráter como conselheiro e amigo? Não usufruímos da eficiência dos nossos deveres devido a espontaneidade do nosso respeito? Isso não era pra ser uma coisa básica entre todos os seres? Uma coisa tão óbvia como essas!?

E o bode responde enquanto mastigava flores de lírio:

- Respeito, eficiência e espontaneidade são três palavras muito bem escolhidas caro Saci, pois as três estão cada vez mais difíceis de se ver por aí hoje em dia, existe pouca confiança entre os seres e isto resulta em falta de respeito ou descaso que gera ineficiência e esconde a espontaneidade atrás de atitudes automáticas e sem imaginação, estes seres todos pensam tanto em vingança e em recuperar seus objetos de poder que esquecem da capacidade que possuem em poder refazer estes objetos e fortalecer a mágica de suas existências como se nunca tivessem sido incomodados por humanos ou qualquer outra raça.

O Saci então dá uma coçada comprida na cabeça e diz como quem desse satisfação ao seu fiel conselheiro:

- Você sempre fala dando ligeiras e macias alfinetadas. Nunca me arrependerei de ter me envolvido com os humanos e estabelecido meus bancos no plano deles, são números que não existem de verdade e mesmo assim eles confiam todos os seus valores materiais e esforços trabalhistas nestes prédios de pessoas e números. É fascinante Bode, nunca vi uma raça fazer isso por vontade própria, tudo que precisei foi dos prédios e das pessoas, eles fizeram todo o resto como se já fossem programados para fazer isso.

Então o Bode interrompe;

- E quem garante que não são programados?

E o Saci então olha aborrecido para o Bode esperando o sermão que já está cansado de ouvir, e o Bode continua:

- Quem garante que você assim como eles não é apenas mais uma peça das "pesquisas científicas de DNA" dos criadores? Eu dou estas alfinetadas por que sou seu bode conselheiro, te quero muito bem,  você queria ser adorado como os ditos deuses são adorados, mas não passou de uma sombra de um conto infantil entre outras mentiras religiosas de um planeta que sei lá para aonde caminha! És na verdade um ser imortal que brinca com valores imaginários no grande parque de diversão dos criadores meu caro! É uma peça deles! Faz o que eles querem.

Então o Saci se levanta bruscamente

- Não! Não! Não e não! Não é assim que funciona! Já te falei!

Diz alterado atirando para longe seu chapéu vermelho

- Eu sempre fiz o que quero! Não sou apegado aos números imaginários e nem aquela raça de escravos, se os criadores de planetas resolvessem apagar aquilo eu pouco me importaria! Não fui criado nem por eles e nem pelos mesmos criadores que eles! Não entendo porque você insiste nisso! Sabe que as lendas que conhecem da gente é tudo mentira pra agente se divertir com eles! Viu o que os dito deuses fizeram ao longo dos séculos terrenos! 

São como brinquedos! Não tem plano algum! Nada maior! Nada superior além de criadores de mundos comuns como em qualquer outra galáxia! Eu e você somos seres tão antigos dos mundos paralelos, influenciamos e alteramos mundos materiais suas religiões e suas crenças! Somos poderosos e imortais! É tudo pura diversão para ocuparmos nossa imortalidade entre diversos mundos e diversas responsabilidades! Qual o problema nisso? Como pode continuar com esta teoria sem cabimento que fora sustentada por seres tão inferiores que acabaram banidos no planeta terra!?

Os infelizes foram condenados a vagar na terra e viraram peixes macacos como o resto dos humanos! Sem mágica! Sem imortalidade! Uma só alma e uma só vida por vez! Um só planeta! Escravos da energia elétrica e de seus veículos e máquinas! 
São apenas coitados, resultado de brincadeiras de outros como nós. Precisamos ajuda-los e ser amados por eles, somos maiores! 
Devemos manipula-los e aceita-los como experiência do merecimento e do reconhecimento da nossa imortalidade, só assim daremos um sentido a nossa existência assim como os dito deuses fizeram!
Por que essa insistência em algo tão burro e antiquado aonde somos tão frágeis quanto qualquer experiência de DNA que se faz por aí meu querido Bode? 

E o Bode responde:

- Você diz que não é apegado a este planeta, mas do que estava reclamando agorinha mesmo?
Aaaa sim! Estava praguejando contra fadas ladras que perderam sua cartinha com algo importante sobre seu mundinho não é mesmo? Está com medo do que tinha escrito na carta não é Saci? Tem medo que saibam mais sobre sua vida nos bancos terrenos?
Tem medo que descubram que você guarda cofres especiais e secretos para os magos que possuem artefatos roubados dos paralelos? De quem realmente você tem medo Saci? Por que teve que confiar em fadas ladras para fazer seus serviços de mensagens urgentes entre os mundos? Qual o grande medo em liberar suas informações nas redes telepáticas além dos paralelos? Nem tudo você conta para seu fiel conselheiro!

E o Saci agitado responde em voz alta

- Você sabe que isso é exagero! eu lhe confio tanta coisa! Mas que audácia que não tem fim! Que eterna desconfiança! Pra que estragar tanta irmandade com desconfianças tão sem fundamento? O que ganha com isso Bode!?

E o Bode então diz o que sabe:

- Pois bem, você me conta tudo né? E por que não me contou sobre uma tal de fortaleza furtada de dentro de seus bancos terrenos e seus cofres mágicos "secretos"? Uma fortaleza habitada e dependente de ninguém mais ninguém menos que Dhalia a senhora da Ilusão em pessoa?

Então o Saci finalmente para de se mexer e num tom muito mais sério e chateado responde;

- Agora eu acho que você foi longe demais com sua desconfiança, você sabe que os cofres enfeitiçados são de conhecimento restrito e que se aquilo realmente foi roubado de lá por alguém que está na Terra então não fica muito difícil de procurar, nada com tanta magia e vida passou por qualquer um dos portais que se ligam na Terra pois uma coisa daquelas não passaria desapercebido em nenhum lugar do Universo, os portões Áuricos iam enlouquecer com a passagem de um artefato como aqueles. Seja quem for está na Terra! Viu só como lhe conto tudo! Só não havia lhe dito nada ainda porque para ter a confirmação sensitiva de que nada passou por portal algum ligado a Terra é uma coisa que leva tempo! A notícia tinha de ser oficial e você se precipitou na sua desconfiança sem limites. 

Então o Saci arruma seu chapéu, dá um forte trago em seu cachimbo e diz para o Bode que permanecia sério e calado;

- Entra no meu cachimbo velho amigo e vamos seguir nossa viajem até as Tendas Estreladas pra saber qual informação aquelas fadinhas escrotas perderam por aí, seja o que for alguém já abriu a mensagem depois que a rainha Agrafena selou a carta com o selo mágico, já nem sei mais quando foi que a mensagem telepática da carta enfeitiçada chegou, nossa pausa foi longa demais! 
O corpo do qual encarno lá na Terra está impossibilitado de suportar minha presença no momento, estou solicitando aos criadores outro corpo para que eu possa atuar por lá sem me cansar tanto mentalmente, enquanto isso se eu puder fazer uma visitinha pessoalmente pegando esta brecha que acaba de se abrir no portal do Arco-Íris, acho que posso fazer uma média com a senhora da Ilusão pois é absolutamente raro minha real presença naquele lugar tão primitivo e pequeno que a tanto tempo não coloco meu verdadeiro pézinho saltitante por lá.

E o Bode com uma cara bem enfezada diz de uma vez para o Saci;

- Pois eu tinha certeza que havia um interesse a mais da sua parte ao chegar neste portal, quer aproveitar para fortalecer sua "grandiosidade" entre os mortais e os imortais com sua presença real!
Mas eu não vou te apoiar desta vez não! Com a Senhora da Ilusão não se brinca! Ela atua diretamente naquele plano e foi moldada pelos criadores para que alterasse qualquer coisa em qualquer circunstância naquele lugar! Se ela tá brava e desconfiada de você então ela deve ter algum motivo! 
 Por isso fico mais confuso ainda sobre o que realmente sei nesta sua história toda com os terrenos e os imortais. Porque se Dhalia é capaz de alterar o que quiser, porque raios ela precisa de um cofre secreto no SEU banco para esconder uma coisa tão importante daquelas? Enquanto ela poderia ter disfarçado aquilo de uma coisa qualquer, sei lá poderia ser um prendedor de cabelo, uma colher de pau, qualquer porcaria!

E o Saci interrompe;

- Já respondi essa Bode! Não deu pra entender que o negócio é poderoso demais? Altamente detectável? Planos inferiores como o terreno precisam de cofres enfeitiçados impossíveis de se detectar por meios mágicos, a frequência natural de lá é baixa demais e qualquer coisinha acima do padrão fica facinho de se conectar. Isso não é novidade pra você Bode, todo plano tem seus cofres! Seus bancos! Eu sou um bom amigo para aqueles humanos e uma segurança para aqueles imortais fardados a cumprir parte de sua imortalidade interferindo diretamente e diariamente na vida daquelas criaturas até que elas terminem de uma vez por todas por elas mesmas! 
 Você entende quando falo para você sobre nossa missão existencial, sobre este ciclo, esta forma de servir nossas longas existências, como amigos dos ditos deuses, como lendas e mitos, amigos dos vivos! Somos histórias e sonhos em bilhões de vidas, porque ignorar isso Bode? Por que não interagir com uma coisa dessas? É claro que quero dar satisfações sérias para a Dhália da ilusão, não quero ela brava comigo não! Realmente não sei o que aconteceu, Legião me contou tudo o que sabia. Sei que se eu conseguir esta proeza raríssima de comparecer pessoalmente no plano Terrestre, demonstrarei minha real importância com este sumiço infeliz.


E o Saci num gesto de bater palmas bem lentamente por três vezes fez com que o seu cachimbo se tornasse grande como um cesto de balão, flutuando a cinco palmos do chão aguardo pelo embarque, o senhor Saci então num pulo adentra o cesto e de lá diz mais uma vez ao bode;

-  Com o tempo eu serei merecedor de reinos inteiramente meus, como os ditos deuses receberam do Universo por seus serviços a imortalidade em prol dos mortais, meus objetivos nunca foram segredo algum pra você! Não seja ridículo! Agora pule já neste cesto ou fique aonde está afogado entre seus lírios pois parto agora mesmo para o plano das Tendas.

Mas o Bode insiste:

- Pois parta! Não sei porque mas sinto que desta vez algo realmente grande está para acontecer, e eu sei que coisa boa não é, na verdade nem sei se é boa ou ruim, mas sei que não quero estar no meio! Pode ir! Boa sorte com suas fadinhas e seus amigos da terra, nos vemos quando aparecer por aqui novamente!

E o Saci responde enquanto o cachimbo enorme rodopia cada vez mais rápido:

- Que assim seja meu caro amigo! Espero que suas idéias mirabolantes não o carreguem ao seu túmulo, se acha que algo está para acontecer, talvez estivesse mais seguro ao meu lado! Até mais ver Bode!

E o cachimbo diminui de tamanho e toma a forma de um pequeno ciclone sumindo entre as folhas das árvores, o Bode então dá um suspiro e diz baixinho:

- Se eu realmente estiver correndo o risco de desaparecer deste plano, que seja em silêncio entre os lírios cintilantes, e não entre você e seus amigos humanos.


FIM DA PARTE 03

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